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Artesanato Picoense em Terras do Canadá

Leoneto Brum da Silveira
Entrevista conduzida por: Manuel Cândido Martins
Fotos: Adiaspora.com

Toronto, Junho de 2011

 


Leoneto Brum da Silveira é um artesão de origem picoense, radicado na Cidade de Toronto que, em suas miniaturas e impulsionado pela saudade, reproduz os artefactos e as alfaias que outrora povoavam o quotidiano dos meios rurais e piscatórios na sua ilha natal.

ADIASPORA.COM: Temos aqui hoje um homem da Ilha do Pico, que se distinguiu pelas suas obras de arte nesta longínqua terra do Canadá. Um astuto artista nato, que revela as habilidades do homem do Pico na arte do artesanato. Os seus trabalhos trazem-nos a cultura de um povo que, no passado, viveu isolado e que, nos dizeres de Camões “por obras valorosas sevão da lei da morte libertando”.

Caro amigo e conterrâneo, pode dizer-nos o seu nome, onde nasceu e a sua idade?

LEONETO SILVEIRA: O meu nome é Leoneto Brum da Silveira. Nasci na freguesia das Ribeiras, lugar de Santa Bárbara, em 1937.

ADIASPORA.COM: Vamos recuar ao tempo da sua infância, vivida intensamente na Ilha do Pico, em Santa Bárbara, na sua adorada freguesia das Ribeiras. O que se lembra dessa época?

LM: Lembro-me muito bem desse tempo, pois foi árduo. Não foi fácil viver, pois o meu pai era muito pobre, minha mãe muito doente, o que me obrigou a começar a trabalhar muito novo e a ajudar a lavar os meus irmãos, lavar a roupa e às vezes ainda cozer bolo.

ADIASPORA.COM: Que idade tinha quando começou a frequentar a escola?

LM: Tinha sete anos.

ADIASPORA.COM: Recorda-se ainda do nome do seu professor e de alguns dos seus companheiros de escola?

LM: Lembro-me. O nome do professor era Ernesto Peixoto. A respeito dos meus colegas, alguns já morreram, outras ainda estão vivos. Sai da escola com 13 anos e principiei a trabalhar com o meu pai de carpinteiro.

ADIASPORA.COM: Do seu tempo de menino e moço, pode descrever-nos a vida dos habitantes de Santa Bárbara das Ribeiras, comparada com a vida de hoje?

LM: Nem se pode comparar, pois a vida de hoje é muito mais fácil. Naquele tempo, andava-se tudo a pé. Era muito árduo. Tínhamos de nos levantar muito cedo para poder chegar aos trabalhos. Hoje anda tudo de bicicleta, de mota e de carro. Por isso, é tudo mais fácil hoje em dia do que antigamente.

ADIASPORA.COM: Qual foi o seu primeiro trabalho depois de sair da escola? Ainda se lembra?

LM: O meu primeiro trabalho foi trabalhar com o meu pai de carpinteiro. No primeiro dia que fui fora, vim trabalhar das Ribeiras para as Lajes a pé. Ir e vir. Cerca de quilómetros a pé, isto é, cinco quilómetros para cada banda.

ADIASPORA.COM: Que idade tinha quando notou que possuía essa sua habilidade artística e começou a reproduzir as coisas que o rodeavam?

LM: O meu primeiro trabalho foi este que está aqui feito (apontando para uma obra sua). O meu pai talhava as aduelas, serrava-as. Eu limpava-as e juntava-as. Depois, era o meu pai que armava as vasilhas, pois eu era pequeno. Já com sete anos eu fazia este trabalho.

ADIASPORA.COM: Santa Bárbara é perto de Santa Cruz das Ribeiras, ficando ao fundo, um porto de pescadores, de baleeiros e barcos de cabotagem, como o Ribeirense e o Andorinha, que navegavam entre as ilhas com carga e passageiros. Mais tarde, foram remodelados e convertidos em atuneiros. Recorda-se desse tempo? Lembra-se do Mestre João e do Mestre Gaspar, esses homens que, com o seu prestígio, deram o seu nome e cartaz a Santa Cruz das Ribeiras? O que nos pode contar sobre os barcos e dos homens desse tempo?

LM: Os homens dessa época, principalmente aqueles dois, foram os grandes impulsionadores de Santa Cruz. O Mestre João foi novo para a América. Depois regressou, fez o Ribeirense,  e acrescentou por duas vezes. O José Gaspar tinha o Andorinha, mas tinha um outro barco, cujo nome não me recordo. Lembro-me de ver o José Gaspar, coitado, com a sua perna amputada, à varanda. Aos sete ou oito anos de idade, comecei a ir a Santa Cruz, acompanhado pelo meu irmão, com a moenda, ou com o milho para moer, a fazer farinha. Levávamos uma lata de milho num pau, um atrás, outro adiante…

ADIASPORA.COM: Pode contar-nos como resolveu vir para o Canadá, uma terra com um clima muito diferente do nosso, sem aquele cheiro a maresia, o garrular das cagarras, as noites aluaradas? Como enfrentou isto por aqui?

LM: Vim para o Canadá a pedido do meu filho. Morreu um vizinho na guerra (do ultramar) e ele perguntou-me: “O pai, eu vou para a guerra?” “ Uma vez que estás aqui, vais.” Ele respondeu: “ E se tio me mandar chamar para o Canadá?” Isto foi o que esteve na origem da minha vinda para cá. Eu não tinha necessidade de emigrar, pois com a arte que tinha lá também vivia. Mas também não perdi nada em ter vindo e tirei o meu filho da guerra! Por isso estou aqui!

ADIASPORA.COM: Passando agora à sua habilidade de artesão, pode dizer-nos se já tinha alcançado o sucesso na Ilha do Pico, ou foi aqui, no Canadá, que desenvolveu este seu dom artístico?

LM: Como já tiver oportunidade de referir, o meu pai construía aduelas. Era tanoeiro. Foi assim que tudo começou. Em vez de andar a pinchar nos caminhos, estava na loja, ou na tenda, a limpar as aduelas, para o meu pai ganhar o pão de cada dia.

ADIASPORA.COM: Onde tem vindo a apresentar os seus trabalhos aqui, no Canadá?

LM: Já os apresentei na Casa dos Açores do Ontário, no III aniversário de Adiaspora.com, e no clube “Asas do Atlântico”.

ADIASPORA.COM: Pode descrever alguns destes seus trabalhos?

LM: Temos aqui uma bacia de lavar as mãos, com o jarro da água, tudo feito pela minha mão. Aqui estão as chamadas canecas, utilizadas na ordenha das vacas. Este é o que se chamava de enchedor, para beber água ou vinho. Usava-se para tirar água do talhão para as panelas, para fazer a sopa. Este outro é uma bacia de lavar bebés. Aqui temos uma celha para lavagem das mãos enquanto aquela é para fazer bolos. Temos outra caneca aqui e ali o balde para encher o tanque de água…

ADIASPORA.COM: Para além dos que estão aqui em exposição, que outros trabalhos gostaria ainda de fazer?

LM: Não sei. Por agora não tenho interesse em mais nada. O interesse que tinha era para ter algo com que me entreter. Com a idade que tenho, para mim já está tudo feito.

ADIASPORA.COM: Muito obrigada por nos ter dado a oportunidade de identificarmos por nome estas suas obras de artesanato regional açoriano, de um modo especial, da Ilha do Pico. Falemos agora um pouco sobre os seus primeiros tempos como imigrante no Canadá. Onde se radicou e onde trabalhou?

LM: Radiquei-me em Toronto e sempre trabalhei nesta zona. Por vezes, saía fora, para outras cidades, mas quando isso acontecia, ia e vinha sempre todos os dias para casa.

ADIASPORA.COM: Ainda se lembra como era Toronto quando aqui chegou, assim como a vivência dos portugueses nesse tempo?

LM: Antigamente era tudo mais difícil do que hoje. Agora, por exemplo, os carros são mais baratos e já se podem comprar. Em tudo é mais fácil viver-se aqui do que então.

ADIASPORA.COM: Que conselho dá às gerações mais novas que aqui, no Canadá, perpetuam a nossa portugalidade. Deverão estas estar mais envolvidas nas lides comunitárias, procurando saber mais sobre a nossa cultura e as nossas tradições?

LM: Sim, principalmente no que se refere a esta tradição artesanal, pois hoje em dia já não há quem a faça na nossa terra. Já fiz várias exposições e nunca ouvi ninguém dizer que queria aprender a fazer isto. Portanto, isto acabou…

ADIASPORA.COM: Antes de terminarmos, poderá dizer-nos quais são os seus planos para o futuro?

LM: Os planos para o futuro agora é viver em harmonia com a minha família e gozar o mais que posso. É tudo que eu quero.

ADIASPORA.COM: A equipa de Adiaspora.com agradece por nos ter concedido esta entrevista, assim como pela amizade e disponibilidade, fazendo votos que continue a produzir e a revelar os seus dons artísticos no artesanato regional da Ilha do Pico.

 O artesão Leoneto da Silveira, ladeado por Manuel Cândido Martins (à esquerda)
e pelo director de Adiapora.com, José Ilídio Ferreira (à direita).

 

 

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info@adiaspora.com

 

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